A expressão “você é o que você come” nunca fez tanto sentido quando se trata da relação entre saúde mental e a alimentação. Uma dieta equilibrada, que inclui vitaminas, proteínas e minerais importantes para o organismo, tem o potencial de ajudar o cérebro a desempenhar melhor os processos cognitivos e emocionais. Por outro lado, deficiências nutricionais, influenciadas por fatores sociais, econômicos e/ou políticos, podem afetar a saúde mental das pessoas. E, em tempos de pandemia de covid-19, este impacto pode ser ainda maior, já que muitas famílias enfrentam dificuldades para terem acesso à alimentação adequada.
Os achados são de uma revisão realizada por um grupo de pesquisadoras da Rede CoVida, iniciativa de colaboração científica e multidisciplinar focado na pandemia de covid-19, que reúne o Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), a Universidade Federal da Bahia (Ufba) e outras instituições. As autoras do estudo publicado na edição de fevereiro de 2021 da Revista Chilena de Nutrición são as pesquisadoras Aline Rocha, Camila Teixeira, Carolina Coelho, Flávia Alves e Daiane Machado.
Os problemas de saúde mental podem ser causados por diversos fatores. Um deles é a alimentação desbalanceada. Uma dieta deficiente em micronutrientes, como as vitaminas e minerais, necessários para o bom funcionamento do cérebro, pode contribuir para o desenvolvimento e agravamento de problemas de saúde mental. Tudo porque tal órgão utiliza esses micronutrientes para manter sua estrutura e desempenhar funções das mais variadas, como a comunicação dentro e fora das células.
Assim, a alimentação desbalanceada, junto a outros fatores, pode também influenciar o surgimento ou a piora de problemas como ansiedade, depressão, desordem bipolar, esquizofrenia, transtorno obsessivo compulsivo, a doença de Alzheimer, entre outras.
Já se sabe, por exemplo, que a concentração dos níveis de vitamina C é menor em indivíduos com depressão, assim como a de betacaroteno, que melhora a memória e pode ser usado na terapia e prevenção da doença de Alzheimer. Níveis extremamente baixos de vitamina D, que está relacionada com a emoção e às mudanças de comportamento, também podem contribuir para sintomas depressivos e o desenvolvimento de demência.
A pesquisadora Camila Teixeira alerta, no entanto, que “o prejuízo não é imediato nem isolado por apenas um desses micronutrientes”. Fatores externos e doenças preexistentes também devem ser levados em conta nesta correlação entre deficiência alimentar e saúde mental.
Pandemia afetou o prato de muitas famílias e poderá impactar na saúde mental
“Existem mudanças no perfil de consumo alimentar durante a pandemia da covid-19, especialmente em populações desfavorecidas”, apontam as pesquisadoras ao longo do artigo científico. Segundo as autoras, as desigualdades sociais se aprofundaram na pandemia, houve uma diminuição da renda de muitas famílias e alguns grupos têm enfrentado uma maior dificuldade para comprar alimentos saudáveis, que estão cada vez mais caros.
Mas não são só nas famílias economicamente vulneráveis que se observa deficiência alimentar durante a pandemia. Algumas pessoas têm se excedido no uso dos comfort foods – alimentos que quando consumidos dão sensação de prazer. São aqueles alimentos doces e os industrializados, que apresentam em cada grama um alto teor de gordura saturada, gordura trans, açúcar, sódio e calorias e baixas quantidade de fibra alimentar e micronutrientes.
Segundo as pesquisadoras, é comum que a ingestão mais intensa desses alimentos possa ocorrer como uma forma de fuga desta atmosfera de estresse e tristeza gerada pelos efeitos da pandemia de covid-19.
A pesquisa alerta também que a excessiva preocupação com a higiene dos alimentos durante a pandemia da covid-19 pode ter limitado as escolhas e preferências das pessoas e incentivado ainda mais a busca por alimentos ultraprocessados. São produtos que, além de exigirem menos tempo de preparo, são mais convenientes porque reduzem a frequência da ida ao mercado e situações de maior exposição ao vírus que causa a covid-19.
As pesquisadoras recomendam a implementação de novas políticas públicas para garantir alimentação adequada e segurança alimentar neste período. “No início da pandemia de covid-19, houve distribuição de cestas básicas e o auxílio emergencial, mas foi insuficiente”, reflete Camila, que defende que as ações precisam ter múltiplas frentes.
Segundo ela, é necessário que os gestores públicos garantam o acesso das populações vulneráveis aos alimentos saudáveis que subiram de preço, incentivem a agricultura familiar e orientem as população de modo geral com informação de qualidade sobre a importância da alimentação saudável.
Cinco sintomas que podem estar relacionados à deficiência nutricional
As pesquisadoras elencaram cinco sintomas que podem estar relacionados a uma dieta alimentar pobre em nutrientes e que pode interferir na rotina diária de atividades dos indivíduos. Uma alimentação saudável e equilibrada e o banho de sol para produção de vitamina D são importantes para evitar este tipos de sintomas.
- Dificuldade para se concentrar e manter uma rotina
- Falta de disposição
- Problemas com o sono
- Mudanças repentinas de humor
- Fadiga física e mental

Links
Fonte 1 – Poder 360: 61% dos brasileiros tiveram a fonte de renda prejudicada pela pandemia
Fonte 2 – G1: Pandemia afetou mais a renda de pretos e pardos, aponta pesquisa
Fonte 3 – Zero Hora: Preços de alimentos sobem até 89,16% no ano e afetam mais o bolso de quem ganha menos
Fonte 4 – Observatório 3º setor: Em meio à pandemia, fome volta para a mesa dos brasileiros
Fonte 5 – Agência Brasil: Consumo de alimentos ultraprocessados cresce na pandemia
Fonte 6 – Revista Chilena de Nutrición. The relationship between nutritional deficiencies and mental health. Autoras: Aline Rocha, Camila Teixeira, Carolina Coelho, Flávia Alves e Daiane Machado